Roupa, rua e identidade: As origens, as transformações e a mistura de estilos na ‘moda Streetwear’

Guilherme Marques

A moda streetwear surgiu no início da década de 80, na Califórnia, tendo forte ligação com diversos movimentos como o surfe, o skate, o punk e, principalmente, o hip-hop. Como o estilo musical estava em evidência nos anos 90, a moda veio para ser um meio de se identificar como parte do movimento e de se expressar dentro e fora dele. Pelo hip-hop ser considerado um dos movimentos que mais influencia esse estilo, pode-se ver que ele está presente até hoje nas marcas de streetwear.  

A moda dos skatistas resume o que é o streetwear (Foto: Reprodução/Adobe Stock)

O estilo streetwear pode ter duas origens. Uma, em Nova York, no fim dos anos 70, quando a moda veio da cultura hip-hop que já estava presente na época. A outra origem quando, em 1980, Shawn Stussy, um fabricador de pranchas de surf, em Los Angeles, na Califórnia, começou a colocar camisas e bonés com a assinatura “emprestada” do tio para serem comercializadas. Assim, surgia uma das primeiras marcas de streetwear no mundo: a Stussy.

Já no fim da década de 80, com o hip hop ganhando muita força nas ruas e com as roupas esportivas em alta, pelo fato de serem bem largas e confortáveis, o movimento aderiu a esse estilo e, ainda, o caracteriza até hoje. Logo, essas roupas começaram a ditar o estilo do que futuramente se chamaria streetwear. Isso fez com que as grandes marcas, principalmente, Adidas e Puma, olhassem para o hip-hop de outra maneira, vislumbrando uma oportunidade de se promover e, dessa forma, resolveram patrocinar artistas que já eram consagrados no meio.

Do ponto de vista da psicologia, não há uma explicação direta do motivo para o indivíduo vestir determinada roupa e há vários fatores que levam a pessoa a se vestir daquela maneira. Os motivos variam desde querer ser aceito em um grupo, comprar roupas caras para se auto afirmar ou até no âmbito afetivo para buscar um parceiro.

Psicólogo Astolfo Monteiro Rainer (Foto: Reprodução/Doctoralia)

O psicólogo Astolfo Monteiro Rainer explica esses motivos subjetivos e sobre contextos que levam um indivíduo a se vestir de variadas maneiras. “A gente consegue perceber que os motivos que levam uma pessoa a se vestir podem ser de naturezas diferentes. Contudo esses fatores podem também coexistir, ou seja, eles podem ter mais de um motivo para se vestir”, explica Astolfo.

O psicólogo completa dizendo que ainda vai depender de quanto o capitalismo está presente na vida das pessoa. Pode-se fazer um paralelo da fala trazendo para o contexto da moda de rua a partir do momento que a streetwear se inspira no hip-hop para produzir vestimentas. “A pessoa leva consigo os mesmos valores e ideais do estilo musical do hip-hop. Um movimento criado nas periferias por pessoas pretas e pobres”.

Apesar disso, a streetwear ganhou o mundo e se tornou um dos principais estilos. A streetwear chegou a importantes desfiles de moda, fazendo com que marcas de alta costura olhassem com mais cuidado para o estilo. Com o sucesso, o estilo chegou ao Brasil, fazendo com que várias pessoas despertassem o interesse de criar marcas próprias para mostrar o próprio trabalho. Atualmente, há em evidência marcas como: HIGH Company, Pace e SufGang. Apesar dessas marcas serem as mais conhecidas do público brasileiro, há várias outras em ascensão.

Yago Victor é o proprietário da JAM Company (Foto: Reprodução/Instagram)

Esse é o caso da JAM Company, marca brasileira e capixaba, criada em 2018, que traz consigo um estilo único, como fala o empresário da marca, Yago Victor. “A ideia de criar a JAM se deu pelo fato de eu ser muito identificado com essa cultura street. Desde que eu tinha uns 10 anos, eu andava de skate e frequentava eventos ligado à cultura urbana, pois meu pai organizava esses eventos culturais”, relata. Yago explica que as pessoas que consomem a marca tem um poder aquisitivo maior e que uma das propostas é justamente levar a cultura urbana em lugares que ela dificilmente chegaria.

Minha mãe é mais referência para mim do que o Kanye West, por exemplo. Várias estampas que saíram nas camisas da JAM foram releituras de desenhos que minha mãe fez de forma amadora. Eu achei interessante trazer para as camisas da JAM.

Yago Victor

A cultura Sneakerhead

O movimento dos sneakerheads é um dos que mais cresce no mundo da moda (Foto: Reprodução/Adobe Stock)

A palavra sneaker significa tênis em português. Assim, Sneakerhead é um termo utilizado para classificar aquelas pessoas que são apaixonadas por tênis. Essas pessoas ficam horas, e até dias, em filas quilométricas para conseguir um tênis de coleções limitadas. Inicialmente, os sneakers foram criados com o intuito de atender a atletas do basquete e do tênis, mas, com a influência do hip-hop, junto com a fama do basquete, rapidamente essa cultura urbana foi ganhando adeptos.

O movimento nasce nos Estados Unidos, no final da década de 80, e está diretamente ligado ao basquete e ao hip-hop. Nos anos 80, o basquete estadunidense desfrutava de grandes jogadores em sua Liga. Nomes como Larry Bird, Magic Johnson e Karl Malone eram destaque em seus times e na seleção americana.

Em 1984, surge Michael Jordan, um calouro não muito badalado na época, mas que mudaria a história do basquete. Nesse período a marca Converse dominava as quadras de basquete dos anos 80 e a Nike estava buscando espaço no esporte. E nesse momento Michael Jordan, ainda muito novo, foi convidado para ser patrocinado pela marca. O primeiro tênis exclusivo do atleta em parceria com a Nike foi Air Jordan 1. Um tênis das cores preta e vermelha que remetiam as cores do time em que Jordan jogava, o Chicago Bulls.

Michael Jordan é um dos responsáveis pelo tênis ser um acessório muito importante no streetwear (Reprodução: Internet)

Logo, o tênis se tornou um sucesso, mas, no mesmo ano em que ele foi lançado, o comissário da NBA, David Stern, proibiu o uso do tênis por causa das cores dele, visto que a NBA só permitia tênis de coloração branca. Esse acontecimento foi o que a Nike precisava para alavancar as vendas e fazer com que o Air Jordan 1 virasse uma febre no universo sneaker. Até hoje a linha Air Jordan é lançada anualmente, inclusive no Brasil, onde esses tênis chegam a custar mais de R$ 1000,00.

Além do basquete há, ainda, a forte influência da música hip-hop na cultura sneaker. O s artistas de rap fazem “Collabs”, colaboração em português, com marcas de tênis. Kanye West e Pharrel Williams com a Adidas e Travis Scott e Skepta com a Nike. Um dos motivos para as pessoas virarem sneakerheads são justamente esses rappers, como explica Pedro Eduardo Dias, um fã da cultura sneaker. “Por gostar muito de rap e trap, principalmente o dos EUA, muitos dos artistas que eu era fã, como o Kanye West e Travis Scott, lançaram colaborações com as marcas de tênis. E, por usá-los como referência de moda, me interessei“.

Essas “collabs”, normalmente, vem em edições especiais e limitadas. Por esse motivo, os sneakerheads fazem loucuras para conseguirem comprar um tênis, de ficar em filas quilométricas durante horas ou até gastarem muito dinheiro. “Gastei o dinheiro que eu tinha guardado para minha carteira de motorista para não perder o lançamento do tênis que eu queria”, afirma Pedro Eduardo, que, atualmente, conta com 9 pares de sneakers de diversas marcas.

Atualmente, a maior parceria de um artista do hip-hop com uma marca, é a Yezzy, marca do rapper Kanye West, que faz parceria com a Adidas. Juntos, lançam inúmeros tipos de tênis que são produtos de desejo de várias pessoas ao redor do mundo.

Edição: José Modenesi

Imagem de destaque: Istock