Opinião – A autoceitação capilar no processo de empoderamento feminino

Kamily Rodrigues

Transição capilar. Termo que parece ser simples, mas traz consigo uma trajetória de empoderamento feminino e que cada vez mais ganha força. Quando falamos de empoderamento, muitas vezes não nos atentamos para o quanto o cabelo está relacionado a todo esse processo, uma vez que está diretamente ligado à autoestima feminina.

As mulheres, em especial as que possuem cabelos crespos ou cacheados, estão quebrando padrões preconceituosos enraizados na sociedade e que durante muito tempo foram impostos de modo que não havia representatividade, seja na televisão, na publicidade ou em produtos capilares. Vale ressaltar que é recente a variedade de produtos específicos para esses cabelos, bem como a valorização por parte da indústria cosmética para esse público.

Representatividade essa que ultimamente pode ser encontrada a partir do momento em que surgem personagens nos meios de comunicação de massa que fogem do padrão, permitindo, assim, que as crianças se identifiquem, como é o caso da princesa Merida, no filme Valente. Além disso, não é difícil encontrar grupos nas redes sociais ou mulheres com grande alcance público que fogem do padrão.

É o caso da atriz Juliana Paes. Ela vem encantando em seu perfil no Instagram ao mostrar o cabelo natural, além de falar sobre como foi para ela durante grande parte da vida ter que fazer uso de apliques ou alisar o cabelo para dar vida a personagens, o que, segundo a atriz, trouxe a sensação de ter esquecido como ela era. É o caso também da youtuber e atriz Kéfera Buchmann. Em um vídeo para seu canal contou que fazia progressiva no cabelo devido ao bullying que sofria no colégio, o que a levou a negar o próprio cabelo e ficar refém do alisamento, mas, atualmente, resolveu assumir o cabelo natural.

Tudo isso está diretamente ligado ao processo de transição, período em que a mulher resolve não mais fazer uso da química, aceitar a si mesma e assumir o próprio cabelo. Muitas mulheres faziam uso de processos químicos para alisar o cabelo e, assim, se sentirem incluídas nos estereótipos de beleza fabricados pela sociedade.

A caminhada para voltar às origens tende a ser dolorosa para muitas mulheres, pois pode durar anos. É um período em que a autoestima tende a oscilar, pois o cabelo se encontra com duas texturas e isso leva muitas delas a desistirem. Contudo, há aquelas que optam por fazer texturização, que consiste em uma técnica realizada para dar formato aos fios por meio de recursos como as tranças. Há, ainda, as que optam pelo ‘Big Chop’, termo em inglês que é usado para se referir a um corte químico no cabelo, que tende a ficar bem curto, pois se deixa apenas a parte natural.

Outra barreira que vem sendo quebrada é a questão de que crespos e cacheados são difíceis de cuidar. Contudo, na realidade, são cabelos, como quaisquer outros, que necessitam de cuidados específicos. Trata-se de mais um pretexto criado pela sociedade como meio de propagar os preconceitos.

Há ainda a ideia de que esses cabelos não podem ser tonalizados, pois, por serem em formato de ‘caracóis’ e serem naturalmente mais ressecados, não aguentariam. Entretanto, é, sim, possível ter um cabelo cacheado ou crespo saudável, mesmo que seja tonalizado. Basta estar disposta a seguir cronogramas capilares.

Muitas mulheres de diferentes faixas etárias têm como referência a youtuber Ca Martins. Ela tem o cabelo colorido e está sempre mudando as cores fantasia. Em seu canal na plataforma, ela dá inúmeras dicas sobre como tonalizar cabelos cacheados de maneira segura. A representatividade dela é tamanha que. hoje, é embaixadora das linhas para cabelos cacheados da Salon Line.  

A youtuber Ca Martins deixa dicas de como tonalizar os cabelos cacheados (Foto: Reprodução)

O período de quarentena levou muitas mulheres a terem coragem passar pela transição. Para muitas delas se tornou o período ideal, pois muitas passaram a trabalhar no sistema “home office”, além de não poderem frequentar a salões de beleza.

Um fator essencial para essas mulheres foi o tempo. Como se encontram em isolamento social, houve redução na correria do cotidiano, o que permitiu um tempo para cuidarem da aparência e se autoconhecerem. Outro fator essencial que também se tornou determinante para muitas mulheres foi estarem longe das pressões sociais que ocorrem na maioria das vezes dentro da própria família. E isso permitiu fazer o ‘Big Chop’ e terem tempo para que o cabelo crescesse, evitando comentários a respeito e trazendo mais segurança a elas.

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