Dia Mundial da Fotografia: O Legado de Sebastião Salgado

Brasileiro contribuiu para evolução da fotografia de técnica experimental à ferramenta de registro, arte e denúncia social

Sebastião Salgado faleceu no dia 23 de maio de 2025, aos 81 anos, em decorrência de um distúrbio sanguíneo causado por malária não tratada apropriadamente (Foto: Tiago Queiroz / Estadão Conteúdo)

Heitor Robers

Perto de completar três meses da morte do renomado fotógrafo, comemora-se em 19 de agosto o Dia Mundial da Fotografia. O LACOS aproveita a data para celebrar a história e o legado deixado por Sebastião Salgado nas diferentes áreas em que atuou ao longo da vida.

História de Vida

Nascido no município de Aimorés, em Minas Gerais, em fevereiro de 1944, Sebastião Ribeiro Salgado Júnior foi um fotógrafo documental. O brasileiro, reconhecido mundialmente por seu trabalho, caracterizou-se pelo uso de fotografias em preto e branco para retratar a condição humana, questões sociais e ambientais.

O mineiro tem uma história especial com o Espírito Santo, declarando em 2012, enquanto fazia gravações no estado:

Tenho orgulho de ter passado boa parte da minha juventude neste lugar, que para mim é o mais bonito do Brasil

Sebastião Salgado mudou-se para Vitória quando tinha 15 anos, graduando-se em Ciências Econômicas na Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), em 1967. Foi também nas terras capixabas que ele conheceu a esposa e companheira de vida e trabalho, Lélia Deluiz Wanick Salgado.

Lélia atuou como curadora e editora nas exposições e publicações de Sebastião Salgado e juntos, fundaram o Instituto Terra (Foto: New Mag / Reprodução)

Antes de migrar para a fotografia, Salgado concluiu o mestrado em economia pela Universidade de São Paulo, em 1968, e o doutorado pela Universidade de Paris, em 1971. Na capital francesa, o mineiro teve o contato direto com a fotografia, utilizando a câmera da esposa para fazer os primeiros registros.

Vida Profissional

O primeiro trabalho de Sebastião Salgado como fotógrafo foi em 1974, como freelancer para a agência Sygma. Após se destacar, foi contratado pela agência Gamma e, no fim de 1979, passou a integrar a cooperativa Magnum, fundada por Henri Cartier-Bresson e Robert Capa, que revolucionou a fotografia documental no século XX.

Em 1981, o brasileiro ganhou ainda mais destaque quando registrou o momento histórico do atentado ao então presidente dos Estados Unidos, Ronald Reagan.

Reportagem da Revista Manchete em 1981 destacando o trabalho de Sebastião Salgado no momento do atentado (Foto: Revista Manchete / Reprodução)

A partir da década de 1980, Salgado passou a se dedicar ao desenvolvimento de projetos pessoais. O fotógrafo produziu, ao todo, 16 livros, além de exposições e reportagens de grande impacto visual e profundo humanismo, com foco em temáticas sociais.

Obras de Destaque

Outras Américas (1986)

Neste trabalho, Salgado registrou povos indígenas de toda a América Latina (Foto: Amazon / Divulgação)

Trabalhadores (1993)

A obra documenta o trabalho de homens e mulheres em atividades manuais intensas, remanescentes de práticas ancestrais (Foto: Amazon / Divulgação)

Gold (2019)

O livro contrasta a busca pela riqueza com as desigualdades sociais enfrentadas na exploração mineral. As imagens mostram homens cavando com as próprias mãos em um cenário que lembra formigueiros (Foto: Amazon / Divulgação)

Êxodos (2000)

Neste livro, o brasileiro registra os movimentos migratórios forçados por guerras, fome e desastres econômicos, revelando a dimensão humana das crises globais e destacando a coragem e a dor daqueles que são obrigados a abandonar os lares em busca de sobrevivência (Foto: Amazon / Divulgação)

Gênesis (2013)

A obra mostra o engajamento de Salgado em questões ecológicas, sendo um convite à contemplação das belezas naturais do planeta e um manifesto em defesa da preservação ambiental (Foto: Amazon / Divulgação)

Impacto e influência na fotografia

Para o fotógrafo e professor da FAESA Vitor Jubini, o que mais chama a atenção no trabalho de Salgado são a dedicação e a entrega do mineiro à fotografia, além do olhar humano que o destacou:

Ele abdicou de uma vida normal, de um emprego de segunda a sexta e de descansar no final de semana, para se lançar no mundo e registrar esses movimentos da humanidade

Vitor Jubini (Foto: Arquivo Pessoal)

Na visão de Jubini, o trabalho de Sebastião Salgado mostra uma sociedade que muitos querem esconder:

Ele joga luz sobre temas pesados e traz a visão humanística da pobreza, da miséria, do êxodo, a locomoção de pessoas refugiadas, sem-teto, perseguições

Para o professor, as fotografias de Salgado são muito mais do que uma referência visual, mas uma forma de estimular o pensamento crítico e a maneira de enxergar o mundo.

Um trabalho muito visceral, muito forte, muito contundente, potente

Em 2025, a Escola de Samba Independente de Boa Vista foi a campeã do Carnaval de Vitória com o enredo Os Olhos do Mundo – Assombros de Sebastião Salgado, homenageando o fotógrafo. 

Vitor Jubini desfilou com a Boa Vista, que teve o enredo elogiado por emocionar e capturar a essência do tema escolhido (Foto: Ricardo Medeiros)

Jubini relatou a alegria ao ver o trabalho do fotógrafo sendo abordado de forma tão acessível por uma entidade popular:

Muitas vezes, nesses trabalhos de fotografia e arte, as mensagens acabam ficando muito restritas a uma bolha, não é uma coisa que circula muito. O que mais me emocionou foi a forma como a escola soube traduzir o trabalho dele de forma acessível para a população. Fiquei muito feliz não só por ter desfilado, mas porque a comunidade absorveu, abraçou as ideias e a Escola soube traduzir muito bem essa mensagem

Instituto Terra

O legado de Sebastião Salgado não se restringe apenas à arte e à fotografia, mas também ao meio ambiente.

Em abril de 1998, ele e a esposa Lélia fundaram o Instituto Terra, uma Organização Não Governamental (ONG) com o objetivo de recuperar a Mata Atlântica e as nascentes da Fazenda Bulcão, onde Salgado passou a infância com a família.

A fazenda de mais de 600 hectares, localizada em Aimorés, em Minas Gerais, foi utilizada para a criação de gado e estava degradada.

Até o começo de 2025, 2.346 hectares de Mata Atlântica foram recuperados (Foto: Instituto Terra via Youtube / Reprodução / Superinteressante)

Além do plantio de árvores e da limpeza de nascentes e afluentes do Rio Doce, o Instituto Terra trabalha com conscientização e educação ambiental nas comunidades da região.

O projeto, que surgiu do sonho ambicioso de mudar o cenário de degradação ambiental no local em que Salgado passou a infância, tornou-se um dos maiores projetos de restauração ecológica e educação ambiental do país.

Prêmios e honrarias  

Ao longo da notável carreira, Sebastião Salgado recebeu prêmios e honrarias, dos quais destacam-se:

  • Prêmio Eugene Smith de Fotografia Humanitária (EUA, 1982)
  • Prêmio Unesco para Iniciativas Bem-Sucedidas (1999)
  • Prêmios World Press Photos em diferentes categorias (1984, 1985, 1988, 1989, 1991, 1992)
  • Eleito membro honorário da Academia Americana de Artes e Ciências (EUA)
  • Doutor Honoris Causa pela Universidade Federal do Espírito Santo (2016)
  • Eleito para o Quadro de Cadeiras de Fotógrafos da Academia de Belas Artes da França (2017)
  • Comendador da Ordem do Rio Branco (Brasil)
  • Comendador da Ordem das Artes e das Letras (França)

“A fotografia que faço é o espelho da sociedade”

Sebastião Salgado