Mães solo impulsionam o empreendedorismo feminino no Espírito Santo
No meio da rotina intensa de cuidar dos filhos e manter a casa em ordem, muitas mulheres encontraram no próprio negócio uma forma de recomeçar

Gabriella Guerra
Diante da falta de oportunidades no mercado de trabalho e da sobrecarga da maternidade solo, muitas mulheres capixabas estão criando os próprios caminhos para garantir o sustento da família. Em diferentes bairros, cidades e contextos, elas empreendem por necessidade, mas também por sonho, e mostram que é possível transformar desafios em oportunidades.
Segundo dados do Sebrae, o Espírito Santo conta com mais de 206 mil mulheres empreendedoras, o que representa 33,86% do total de empreendedores do estado. Além disso, 57% dessas mulheres deixaram o emprego formal para começar o próprio negócio. A decisão, em muitos casos, vem da necessidade de conciliar trabalho e maternidade, diante da falta de rede de apoio.

Autonomia e Dignidade
Para a gestora do Sebrae Delas, Suzana Fernandes Sanches, esse crescimento expressivo reflete não só o aumento no número de empreendimentos liderados por mulheres, mas também uma busca por autonomia e dignidade. “Mais do que os números, esse movimento revela um desejo genuíno de ter controle sobre a própria vida e decidir os rumos da própria carreira”, afirma. Segundo ela, muitas mulheres acabam empreendendo como alternativa ao mercado de trabalho tradicional, que ainda apresenta muitos obstáculos para quem é mãe.
Foi o que aconteceu com Ana Rogéria Ferreira Silva, confeiteira e mãe de três meninas. Ela começou a empreender ainda durante a gestação da filha mais nova. Antes, trabalhava em um shopping e percebeu que não conseguiria dar conta da rotina fora de casa e dos cuidados com as filhas pequenas. Ela revela que, no início, pensou em desistir algumas vezes, mas encontrou nas filhas a motivação para continuar. Mesmo sem ter rede de apoio por perto, seguiu em frente por conta própria.
A adaptação à nova rotina exigiu paciência, principalmente nos momentos em que precisou abrir mão de acompanhar de perto eventos importantes das filhas. Ainda assim, vê no empreendedorismo a oportunidade de estar mais presente na educação delas. “Hoje o que mais me motiva ainda continua sendo elas, pois eu tenho mais tempo para educar e conviver com elas”, afirma.
Modelo Híbrido
Samara Rezende, designer de interiores, também é mãe e empreendedora, decidiu abrir o próprio negócio em busca de mais qualidade de vida. Antes disso, atuava em um emprego formal, mas sentia a necessidade de mais liberdade para organizar a rotina com a filha. Com o tempo, encontrou no modelo híbrido de trabalho uma solução que lhe permite trabalhar em casa durante parte da semana e fazer atendimentos presenciais nos outros dias.

Um dos maiores desafios enfrentados por Samara foi a gestão financeira do negócio. Para ela, o equilíbrio das contas é fundamental, especialmente quando se tem uma criança e imprevistos fazem parte do cotidiano.
Apesar das dificuldades, o que a move é o amor pelo que faz e a possibilidade de acompanhar de perto os momentos importantes da filha. “O empreendedorismo me permite (estar presente na vida da minha filha de uma forma que um trabalho convencional não permitiria”, destaca.
Ela conta com uma rede de apoio formada por familiares próximos, como o pai e a irmã, o que considera essencial para conseguir se dedicar ao trabalho com mais tranquilidade e foco.
Ter tempo para tudo
Segundo Suzana, não há dados estaduais específicos sobre mães solo empreendedoras, mas essa realidade é evidente nos atendimentos realizados pelo Sebrae. Ela destaca que uma pesquisa nacional da Rede Mulher Empreendedora mostra que 37% das empreendedoras brasileiras são mães solo, o que reforça a importância de criar políticas públicas voltadas a esse público. Para ela, o tempo é um dos maiores desafios enfrentados por essas mulheres, que muitas vezes conciliam sozinhas a criação dos filhos e a gestão do próprio negócio.
Essas trajetórias mostram como o empreendedorismo tem sido um caminho possível para mães que desejam conciliar trabalho e presença na criação dos filhos. Mesmo com desafios distintos, elas compartilham o desejo de autonomia, estabilidade e tempo de qualidade com os filhos, e constroem, a cada dia, novas formas de existir no mercado e na maternidade.
E mesmo sem garantias, elas seguem em frente, provando todos os dias que coragem também é um jeito de maternar.