Rodas de conversas promovidas pela Semana Fashion Revolution e o curso de Design de Moda da FAESA

Para celebrar a Semana Fashion Revolution, a FAESA Centro Universitário foi palco de rodas de conversas que abordaram histórias de costureiras e a acessibilidade no mundo da moda

Natan de Oliveira e Camila Buzzette

O curso de Design Moda da FAESA Centro Universitário, em parceria com a Fashion Revolution Brasil, ofereceu aos alunos duas rodas de conversas para serem abordadas temáticas revolucionárias no mercado da moda. O objetivo era criar debates produtivos sobre questões pouco valorizadas na área e que precisam de mais atenção.

A Fashion Revolution é um movimento global que luta por uma indústria da moda que valoriza as pessoas e o planeta acima do dinheiro. Com o objetivo de reimaginar coletivamente um sistema de moda justo e equitativo foi criada a Semana Fashion Revolution, campanha anual que reúne a rede do movimento global para 10 dias de ações pelo Brasil.

Quem Faz Minha Roupa? Costureiras e seu Papel na Moda

No dia 22 de abril, o foco da roda de conversa foi a respeito do papel das costureiras e a importância delas no mercado fashion. Foram convidadas as costureiras Cirlene Frolich, Maria Das Dores e Érika Diogo Moura para contarem sobre as trajetórias, histórias e batalhas pela valorização da profissão.

Roda de conversa composta por Stella Polini, Glenda Duarte, Cirlene Frolich, Maria das Dores e Érika Diogo Moura (Foto: Natan de Oliveira)

A ideia do debate surgiu da linha de pensamento em que a moda perpassa por vários campos de atuação. As costureiras possuem um papel essencial na produção de roupas, que é a confecção do produto, sendo, muitas vezes, uma etapa desvalorizada por quem consome o material final ou até mesmo pelo próprio mercado.

A representante local da Fashion Revolution, Glenda Duarte, conta que o movimento existe para trazer a transparência da moda nos vários âmbitos e, assim, torná-la cada vez mais ética, justa e que saiba valorizar a mão de obra das pessoas que trabalham nesse mercado. Glenda pontua ainda que muitas costureiras têm vergonha de falar sobre a profissão, pois acreditam que é um trabalho à margem da sociedade. “Por muitos anos foi e, ainda, de certa forma, para muitas pessoas, continua sendo. Por isso, é importante valorizar essas profissionais”.

Esse momento de conversa com as costureiras foi para podermos ouvi-las. Sem elas, não seria possível ter as vestimentas

Glenda Duarte
Alunos do curso de Design de Moda participando da roda de conversa sobre “As costureiras e seu papel na moda” (Foto: Natan de Oliveira)

Sobre o modo que as costureiras são tratadas nas fábricas de tecidos, foi dito, no bate-papo, que geralmente o ambiente não é adequado para o trabalho e é insalubre, ocorrendo, por exemplo, a falta investimentos em cadeiras ergonômicas e carga horária de trabalho exaustiva. Foi abordada a existência de trabalhos análogos à escravidão nesses ambientes, pois as costureiras são colocadas em situações questionáveis e recebendo pouco retorno financeiro. Isso causa a desumanização da profissão e, em alguns casos, a desistência dessa área de trabalho, trazendo, assim, a característica de ser uma profissão com alta rotatividade de funcionários.

As costureiras falaram sobre a importância de serem tratadas com humanidade. São pessoas reais por trás desse trabalho árduo. Pessoas com sentimentos, necessidades fisiológicas, com famílias, filhos etc. É necessária a  integridade física e emocional para a execução de qualquer trabalho com excelência. Ter um ambiente de trabalho saudável é indispensável para gerar produtividade e bons resultados

Os próprios consumidores acabam alimentando essa potência de desvalorização e desumanização da profissão quando, por exemplo, questionam e reprimem o valor final aplicado no produto feito por costureiras autônomas. As costureiras explicam que a escolha de bons tecidos, técnicas aprimoradas, benefícios trabalhistas e salários justos contribuem para o preço final de uma peça.

Costureiras e empreendedoras conversando com os alunos (Foto: Natan de Oliveira)

A estudante do primeiro período de Design de Moda Carolina Demuner conta que o tema pautado é extremamente importante para entender os bastidores da produção de roupas. Ela relata que as pessoas que fazem essas peças, estatisticamente, em sua maioria, são pessoas pretas e indígenas e que trabalham em ambientes desumanizados.

Me choca o fato de que, ainda, atualmente, essas mulheres são colocadas nessas situações dentro de uma área tão importante. É uma profissão essencial que, infelizmente, é invisibilizada

Carolina Demuner
As reflexões foram essenciais para a construção de uma moda mais humanizada (Foto: Natan de Oliveira)

Desafios da Moda Inclusiva – Acessibilidade para Tod@s

A segunda roda de conversa foi realizada com figuras influentes da moda no Espírito Santo: Karini Capucho, formada em fisioterapia e empreendedora, e a Ashanti Makida, graduanda em artes plásticas. As duas abriram uma discussão sobre como a moda não valoriza corpos individuais, invisibilizando o que foge dos padrões estéticos. A mediação da conversa foi realizada pelo aluno do curso de Design de Moda Augusto Cesario.

Ashanti Makida, Karini Capucho e Augusto Cesario com olhar atento ao vídeo da Fashion Revolution (Foto: Camila Buzzette)

Para iniciar a conversa, foi abordado o processo de produção delas com os produtos. Ashanti demonstra que ao produzir uma peça, ela “mergulha” no processo, fazendo pesquisas e, juntamente a quem fez o pedido da roupa, procura criar algo que represente o que essa pessoa quer falar e expressar. Ela diz, também, que a produção é um processo não linear e que reutiliza tecidos, buscando uma maior sustentabilidade na confecção.

Na mesma abordagem, Karini, utilizando da formação em fisioterapia, usa a moda como processo terapêutico. Ela explica que precisa de diversas pesquisas, aprovação dos produtos para que se tenha a certeza da funcionalidade e que todo o processo demora cerca de 1 ano para ser concluído. “Meu objetivo não é a estética, é adequar a moda aos que não são vistos”.

Ashanti Makida e Karini Capucho debatendo a Moda Inclusiva (Foto: Camila Buzzette)

Ashanti Makida contou que produz a moda de uma forma que seja condizente com todos os corpos, visibilizando quem se encontra invisível e priorizando a saúde mental das pessoas. Ela afirma que a produção que faz é um protesto. Uma busca de intervenção a uma moda capitalista e que prioriza apenas quem está dentro de um padrão. O intuito é que as pessoas consigam se expressar, indiferentemente dos corpos ou orientações sexuais. Ashanti, por ser uma travesti não binarie, conhece essa exclusão e a vivencia no trabalho e no cotidiano. Por isso ela busca protestar e mostrar a realidade da moda.

Ashanti Makida procura mostrar a realidade da moda (Foto: Camila Buzzette)

A indústria da moda não são mil maravilhas. Ela agride e polui

Ashanti Makida

Durante a apresentação foi abordado algumas porcentagens, como: a cada 3 minutos no Brasil uma pessoa preta morre e que o País está em primeiro lugar no ranking de países que mais matam pessoas trans. Ashanti é movida por essas estatísticas e protesta isso nas roupas. Para ela, uma pessoa transsexual não vive, ela sobrevive. Por isso, faz-se necessário a visibilização dessas pessoas para que sejam vistas, ouvidas e compreendidas. A estudante de artes mostrou que a moda é muito mais que estética, é também uma crítica social, uma fala, uma expressão.

Não tem como falar de moda sem falar de dor. E é a fala que cura

Ashanti Makida

Karini Capucho, ao contar a própria trajetória, afirmou que buscava uma forma de fazer mudanças na vida das pessoas, mas não sabia como. Até que, ao longo da carreira de fisioterapeuta e de sua gravidez, ela percebeu a dificuldade da mulher grávida em se vestir e se identificar. Assim, costurando à mão, a empreendedora criou uma cinta para ajudar no corpo pós gravidez. Esse foi o ponto de partida no âmbito da moda.

A partir desse momento, ela começou a produzir, juntamente com pesquisadores da UFES, maneiras de ajudar outras pessoas. Ela criou roupas íntimas com compartimentos para a colocação de compressas frias para ajudar as mulheres trans que buscam “aquendar” – prática utilizada para esconder os órgãos genitais. Karini criou, também, para crianças com queimaduras, uma proteção personalizada para a área afetada, pois muitas delas ficavam com vergonha do tecido bege aparente.

Karini Capucho busca na moda uma maneira de fazer mudanças na vida das pessoas (Foto: Camila Buzzette)

Ao concluir as reflexões propostas, Ashanti e Karini mostraram aos alunos presentes que a moda é um empoderamento, uma expressão. Para elas, a moda é o que é sentido e o que é vivido pela pessoa que a usa. Assim, mostrando suas jornadas, elas incentivaram e ensinaram sobre a diversidade, a empatia e o acolhimento. As duas transbordaram os conceitos da moda e mostraram a quem estava presente uma diferente realidade, algo que não é muito debatido e visibilizado ao público.

A aluna do 1º período do curso de Design e Moda Luana Pereira afirmou que a conversa foi bastante esclarecedora tanto sobre a revolução da moda quanto sobre os desafios na inclusão social. Ela crê que foi uma ótima oportunidade de explorar a moda como um veículo de mudança social e representatividade.


Edição: Natan de Oliveira e Camila Buzzette

Foto do Destaque: Natan de Oliveira