A importância do cooperativismo e os seus impactos na sociedade
Em um mundo individualista e competitivo, o cooperativismo surge como um instrumento para a promoção e preservação de valores fundamentais para a vida em sociedade como a democracia, a igualdade, a solidariedade e a inclusão social
Nayra Loureiro
A palavra “cooperativismo” origina-se do latim “cooperativus” e refere-se a um modelo de organização social e econômica em que pessoas e empresas se unem em prol de um interesse comum. De modo prático, as cooperativas de crédito, agropecuária, consumo, infraestrutura, saúde ou transporte trabalham para satisfazer as necessidades e aspirações econômicas, sociais e culturais não só dos membros, mas, principalmente, das comunidades em que atuam.
O sociólogo Aloísio de Azevedo afirma que a gestão participativa das cooperativas contribui para o progresso de toda a sociedade. O sociólogo lembra que há inúmeros projetos realizados por cooperativas que levam em consideração o desenvolvimento sustentável por meio do cuidado com os recursos naturais e, consequentemente, promovem a solidariedade, a inclusão social e fortalecem as relações baseadas nos princípios democráticos.
Nesse sentido, o diretor-executivo da Organização das Cooperativas do Brasil no Espírito Santo (OCB-ES), Carlos André Santos de Oliveira, explica que a principal diferença entre uma cooperativa e outro modelo de negócio presente na sociedade é a essência. O cooperativismo, segundo ele, é uma sociedade de pessoas e não de capital.
Carlos André reforça que por meio das ações de uma só cooperativa inúmeras pessoas são beneficiadas com oportunidades de trabalho, renda, cidadania e dignidade. O diretor-executivo afirma ainda que, comprovadamente, nas sociedades em que o cooperativismo atua de forma ativa, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é bem maior.
Quando as cooperativas se unem, os resultados são ainda melhores. É o que acontece no dia internacional do cooperativismo, comemorado sempre no primeiro dia do mês de julho. Nesse dia, denominado de “Dia de Cooperar”, as cooperativas de todo o Brasil realizam inúmeras ações de cunho social como reformas de escolas públicas, creches e Apaes, reformas e manutenção de praças e espaços públicos, doação de equipamentos para hospitais públicos e dentre outras ações que visam promover o bem-estar social.
Carlos André destaca também que o cooperativismo está presente no cotidiano das pessoas mais do que podem imaginar. Por exemplo, no café da manhã, vários produtos são produzidos por cooperativas agropecuárias. No dia a dia diversas transações são feitas em cooperativas financeiras, imóveis são adquiridos por meio de cooperativas habitacionais e pessoas são atendidas por médicos que fazem parte de cooperativas de especialidades médicas.
Quer ouvir o relato completo do diretor-executivo da Organização das Cooperativas do Brasil no Espírito Santo (OCB-ES)? Acesse no link abaixo:
O presidente da Cooperativa Agrária de Cafeicultores de São Gabriel (Cooabriel), Luiz Carlos Bastianello, reitera que as ações realizadas pelas cooperativas não refletem apenas na vida dos cooperados, mas, também, em toda a sociedade, já que o cooperativismo atua como um prestador de serviços.
Luiz Carlos Bastianello explica que o cooperativismo é como uma cadeia. Quando os serviços são prestados de forma eficiente, os cooperados têm acesso à informação e, uma vez bem-informados, inúmeros conhecimentos são adquiridos, seja em relação à forma de conduzir o negócio para obter maior rentabilidade, seja com relação à capacidade de promover o bem-estar coletivo e de cuidar dos recursos naturais.
Tais cuidados se referem aos pilares do tripé da sustentabilidade: econômico, social e ambiental. O tripé é uma das premissas que norteiam a atuação do cooperativismo. Onde esses pilares são implantados, há melhoria de vida. Sob a minha visão, é nesse sentido que uma cooperativa muda totalmente a condição da comunidade onde está inserida
Luiz Carlos Bastianello
Já o presidente da Nater Coop, maior cooperativa agro do Espírito Santo, Denilson Poltratz, garante que as ações da Instituição estão diretamente relacionadas aos princípios fundamentais do cooperativismo. Ele explica que a organização trabalha incessantemente para incentivar a participação dos membros na gestão da cooperativa, bem como na tomada de decisões, promovendo, assim, o empoderamento e o desenvolvimento econômico dentro da comunidade onde está inserida. “Mais do que o fim, nos importamos com o caminho. Profissionalizamos e capacitamos nossos cooperados e colaboradores com consultorias técnicas e ferramentas para que se desenvolvam cada vez mais”
Cooperativas na promoção da equidade de gênero
Dados divulgados pelo Anuário do Cooperativismo 2023 revelaram que, em 2022, o percentual de mulheres no quadro de colaboradores do cooperativismo capixaba correspondeu a 209.602 cooperadas, o que corresponde a 59,3% do total. O número reflete o compromisso do cooperativismo com a promoção da equidade de gênero dentro das cooperativas e na sociedade como um todo.
O sociólogo Aloísio Azevedo analisa que, na sociedade contemporânea, há um notório movimento de mulheres que reconhecem a capacidade dentro de si de fazer suas próprias escolhas e, a partir disso, se unem com outras mulheres com o mesmo potencial. Ele afirma ainda que esse movimento é ainda mais evidente dentro das cooperativas, pois, historicamente, devido a intensa valorização da união em prol de um objetivo em comum, o cooperativismo gera empoderamento.
O grupo “Póde Mulheres” da Cooperativa dos Cafeicultores do Sul do Estado do Espírito Santo (Cafesul) surgiu em 2016 após a percepção de que apenas homens frequentavam a cooperativa. A coordenadora do grupo, Natércia Vencioneck, explica que há 10 anos não se ouvia falar de mulheres na cafeicultura. Hoje, o grupo, formado por mais de 30 mulheres, é responsável pela produção, do plantio à colheita, do único café 100% conilon produzido por mulheres no Brasil.
Já a vice-presidente e conselheira de Administração da Cooperativa de Transporte Escolar do município de Afonso Cláudio (Coopetac), Renata Eller, afirma que o empoderamento feminino está nas raízes do cooperativismo. Renata Eller entrou para o quadro social da Coopetac em 2006 como conselheira fiscal e, com o apoio e o incentivo dos membros da cooperativa, chegou ao cargo de vice-presidente.
Na minha função, eu faço de tudo um pouco. E é por meio do cooperativismo que tiro a maior parte da renda da minha família
Renata Eller
Renata Eller ainda explica que dentro da cooperativa há um Núcleo Feminino formado por cerca de 20 mulheres que se unem em prol de causas sociais. Um exemplo é o “Dia C: Coopere com a vida e doe sangue”. Nesse dia, o Núcleo Feminino se reúne para levar pessoas até a capital do Estado para doar sangue e todo o custo do transporte fica por conta da cooperativa.
Outro exemplo de incentivo à equidade de gênero dentro das cooperativas é o Núcleo Feminino da Cooperativa Agrária de Cafeicultores de São Gabriel (Cooabriel) criado no ano de 2009. A coordenadora do Núcleo, Nadya Bronelle, explica que, desde a criação, o núcleo organiza eventos e cursos com intuito de proporcionar um crescimento pessoal e profissional às mulheres que fazem parte da cooperativa.
Todo o engajamento e às conexões criadas entre as mulheres a partir dos projetos pensados pelo Núcleo Feminino da cooperativa refletem não só na vida de cada uma, mas, também, no funcionamento da cooperativa em sua totalidade
Nadya Bronelle
A partir do sucesso do Núcleo Feminino da Cooabriel, Nadya Bronelle foi indicada para ser representar o Espírito Santo no Comitê Nacional das Mulheres Cooperativistas – mais conhecido como “Elas pelo Coop”. O comitê foi criado pelo Sistema OCB Nacional visando estimular a participação de mulheres nas cooperativas brasileiras, oferecendo capacitação e colocando-as em evidência.
Nadya Bronelle relata que no comitê nacional há representantes de quase todos os estados brasileiros. “A intenção é inserir todas as cooperativas do Brasil nesse projeto de estímulo a participação feminina. O ‘Elas pelo Coop’ é um grupo de trabalho que deseja transformar o cooperativismo, valorizando, apoiando e incentivando a participação feminina em busca de um cooperativismo com mais representatividade”, finalizou.
Quer assistir o depoimento completo da Nadya Bronelle? Clique no link abaixo e veja o vídeo
Empoderamento Feminino
A psicóloga Ariele Fabre avalia a importância da criação de projetos com foco no empoderamento feminino como os realizados pelas cooperativas capixabas. Sob a ótica da psicologia, Ariele Fabre explica que para entender os impactos que esses projetos têm na sociedade, antes é preciso refletir sobre a sociedade patriarcal e toda a construção histórica em torno do sexo feminino.
A psicóloga também destaca que, historicamente, as mulheres possuem uma empregabilidade muito menor que os homens e, quando conseguem um emprego, geralmente, são em áreas menos valorizadas e com baixa remuneração. “O mercado de trabalho é muito cruel com as mulheres, principalmente após a maternidade”, disse a psicóloga.
Por essa razão, Ariele Fabre reforça que projetos que visam capacitar as mulheres e, de modo consequente, torná-las independente financeiramente de seus companheiros são de suma importância para que muitas delas tomem coragem para sair de relacionamentos tóxicos e abusivos, por exemplo.
Cooperativismo e esporte
Cooperativismo e esporte. O que eles têm em comum? Ambos valorizam a união, a cooperação, a solidariedade e a busca por um objetivo em comum. Para além de uma simples prática de exercícios físicos, o cooperativismo incentiva a prática esportiva como uma forma de desenvolver nas comunidades locais habilidades e valores como o trabalho em equipe, o respeito, a disciplina, a liderança e a determinação.
As cooperativas podem incentivar o esporte de diversas formas, dentre as quais pode-se destacar: apoio financeiro a projetos sociais ligados ao esporte; construção e manutenção de espaços públicos destinados à prática esportiva, como quadras e campos; organização de atividades esportivas; e fornecendo equipamentos e materiais esportivos para a comunidade, como bolas, raquetes, redes e uniformes.
O “Esporte do Bem”, patrocinado pelo Instituto Unimed Vitória, é uma dessas iniciativas. O coordenador do projeto, Felipe Azevedo, explica que o “Esporte do Bem” é um projeto esportivo social com três núcleos na Grande Vitória. Ao todo, são atendidas cerca de 700 crianças nos municípios de Vitória, Cariacica e Serra.
Nos núcleos são realizadas aulas de Futebol, Futsal, Vôlei e Basquetebol duas vezes por semana. Os uniformes e materiais são disponibilizados de forma gratuita e, além do apoio dos treinadores, as crianças são assistidas por uma equipe de Serviço Social do Instituto Unimed.
O coordenador do projeto afirma também que os impactos positivos na vida de quem participa do projeto são evidentes. De acordo com Felipe Azevedo, as famílias dos inscritos relatam melhorias no desempenho escolar, no comportamento, nos hábitos alimentares e nos cuidados com a saúde em geral.
Ouça o relato do coordenador do projeto “Esporte do bem”, Felipe Azevedo:
Erika Assis, mãe do Bernardo, participante do projeto, garante que são incontáveis os benefícios que o esporte trouxe para a vida da criança. O principal, de acordo com ela, foi o desenvolvimento de habilidades como a paciência, a organização e a disciplina dentro e fora do campo.
Veja o vídeo da entrevista completa com a Erika Assis e seu filho Bernardo:
O Sistema de Cooperativas Financeiras do Brasil (Sicoob) também apoia projetos sociais ligados ao esporte por meio do “Edital de Projetos Sociais”. O projeto “Esporte no Vila“, realizado na cidade de Vila Velha, é um deles. Mariana Ribeiro da Silva, 18 anos, atleta que, atualmente, faz parte da Categoria Sub 20 da Seleção Brasileira, foi aluna do projeto “Esporte no Vila”.
Ao se destacar na posição de goleira, Mariana chamou a atenção dos diretores do Instituto Social Vila Velhense, que entraram em contato com a equipe do Fluminense do Rio de Janeiro. Após ser submetida a um período de testes, a goleira foi incorporada ao elenco e, posteriormente, devido ao seu desempenho, foi convocada para fazer parte da Seleção Brasileira.
O coordenador do projeto, Miguel Angelo Tres, explica que a Instituição recebeu um investimento de R$ 20 mil por meio do 3.º Edital Social do Sicoob ES. “O apoio da cooperativa é fundamental para podermos viabilizar os materiais necessários para os treinos dos atletas. Assim, como foi com a Mariana que hoje está na Seleção Brasileira, buscamos oferecer as melhores condições aos demais alunos que fazem parte do ‘Esporte no Vila’”, esclareceu o coordenador.
A superintendente de pessoas e responsabilidade social do Sicoob ES, Sandra Kwak, explica que com o apoio das cooperativas as pessoas ganham qualidade de vida e, dessa forma, os valores do cooperativismo são disseminados de modo que cada vez mais pessoas conheçam os benefícios desse modelo de negócio.
Cooperativismo para democratização do acesso à cultura
O cooperativismo, enquanto modelo de negócio, possui como um dos principais propósitos o fomento ao desenvolvimento tanto social quanto econômico das comunidades em que atua, sendo evidente, portanto, que a promoção da cultura também faz parte desse contexto. Ao valorizar as tradições e expressões culturais, artísticas e literárias, as cooperativas incentivam a diversidade, promovem a inclusão social e contribuem para um desenvolvimento mais sustentável e enriquecedor da sociedade, ações intrinsecamente conectadas aos valores fundamentais do cooperativismo.
Por meio do “Edital de Projetos Sociais” o Sistema de Cooperativas Financeiras do Brasil no Espírito Santo (Sicoob-ES) apoia diversos projetos ligados à cultura. A iniciativa seleciona quais serão as entidades sem fins lucrativos que receberão o apoio financeiro da cooperativa, que pode chegar até R$ 50 mil por entidade selecionada, conforme a viabilidade e impacto do projeto.
A superintendente de pessoas e responsabilidade social do Sicoob-ES, Sandra Kwak, relata que, a partir do “Edital Social”, o Sicoob materializa o 7º princípio do cooperativismo que é o interesse pela comunidade. Com isso, o cooperativismo se torna uma das soluções viáveis para a resolução de problemas sociais e econômicos das comunidades.
Em cumprimento ao mesmo princípio, a Unimed Sul Capixaba realiza o “Cinema Social”. A iniciativa consiste em oferecer sessões de cinema gratuitas para crianças e adolescentes que participam de projetos sociais apoiados pela cooperativa, além de filhos de cooperados e colaboradores.
O vice-presidente da Unimed Sul Capixaba, Bruno Beber Machado, declara que nas duas edições do projeto, em 2019 e 2022, mais de 600 pessoas foram beneficiadas. Sob a perspectiva do vice-presidente, o projeto é uma oportunidade única para que crianças e adolescentes usufruam de uma experiência cultural gratuita e, ainda, participem de um momento de integração e socialização com outras pessoas.
Além disso, Beber Machado assegura que o projeto também abre espaço para crianças de escolas públicas, ampliando o alcance da iniciativa e proporcionando a oportunidade de acesso à cultura para aqueles que não teriam condições de arcar com os custos de uma ida ao cinema.
A autônoma Juliana Godoy é mãe de Anna Júlia, 14, e João Pedro, 9, que participam do projeto social “Casa Verde” apoiado pela Unimed Sul Capixaba. Em virtude disso, ambos já participaram do “Cinema Social”. Juliana Godoy alega que proporcionar às crianças momentos de interação social em meio a era digital é de suma importância.
Quando acompanhei a ida das crianças ao cinema, vi a alegria e satisfação nos olhos de cada uma. Um momento único que ficará na memória
Juliana Godoy
Ouça o relato da autônoma Juliana Godoy no link abaixo:
Edição: Nayra Loureiro
Imagem do Destaque: Nayra Loureiro