‘Para Sempre, Elas’: histórias de vida de mulheres vítimas de feminicídio

Loren Peterli

Capa do livro reportagem (Print do E-book)

Uma a cada 3 mulheres assassinadas no ES é vítima de feminicídio. O Espírito Santo é o 12° estado brasileiro com maior frequência de feminicídio. Em 2022, os casos de feminicídio teve um aumento de 46%. Esses são alguns dos milhares de dados que existem no Estado. O mais recorrente é a quantidade de números e nenhuma história registrada. Apenas estatísticas feitas pelo Censo com uma humanização inexistente, porém, é isso que diferencia a jornalista formada na FAESA Centro Universitário Nathalia Ferreira.

O livro Reportagem “Para Sempre, elas” foi produzido por Nathalia como Trabalho de Conclusão de Curso (TCC). A escolha do tema pela autora foi devido à proximidade com o assunto, até demais, que vai além de ser apenas mulher, mas ainda por ter sofrido violência e quase ter se tornado uma estatística de feminicídio. A jornada é contada justamente por uma sobrevivente que relata a vida das mulheres: Maria Madalena, Shirley, Vivian, Luana, Jaciara, Irlane, Laura e Raissa que não tiveram a chance de se defender. 

A jornalista Nathalia Ferreira (Arquivo pessoal)

Mesmo com a situação ficando no passado, a dor ainda fica, e a autora necessitava transformar a dor em algo que contribuísse para que os homens enxergassem as mulheres com novos olhares, principalmente de respeito. A professora da FAESA Maria Emilia Pelisson direcionou o estudo com inspiração no livro “O obituário do New York Times”, que relata a vida daqueles que já se foram. A ideia de fazer o Livro-reportagem partiu do princípio de contar a vida de mulheres que ninguém conhecia, mas que tinha uma vida significativa, além de conscientizar os indivíduos que elas estão morrendo apenas por serem mulheres.  

O processo de criação da obra foi bem complicado já que os crimes abordados no trabalho foram casos entre 2019 e 2021 e muitos deles não tiveram nem o desfecho: o caso não foi a julgamento ou não foi encerrado. As famílias ainda estão na trajetória de superar o momento de luto e a jornalista conta o quanto foi desafiador: 

Escrever sobre essas situações é apavorante e encorajador ao mesmo tempo. É apavorante porque são pessoas comuns. Você reconhece casos perto de seus amigos e familiares, tão próximo. São mulheres que tinham sonho, uma vida e alguém se achou melhor do que elas e no direito de tirar a vida delas. Mulheres dignas de viver e que não tiveram a oportunidade de se defender. É encorajador porque não tem como não se emocionar ouvindo essas histórias. Isso me encoraja a falar cada vez mais sobre feminicídio. Os casos só vão diminuir quando as pessoas entenderem a importância das mulheres

Nathalia Ferreira
Nathalia ganhando o Prêmio Policiais Federais de Jornalismo de 2022

O Livro-reportagem tem o objetivo de influenciar a sociedade como um todo, independentemente da idade ou gênero. Mas, principalmente, as mulheres que muitas vezes não tem a consciência que estão em um relacionamento abusivo para que se enxerguem nesses relatos. Nathalia alerta que a população precisa conhecer para entender o que acontece, pois, um cara que te priva de alguma coisa hoje, pode ser o seu assassino futuramente.   

Além disso, o livro-reportagem ainda não está finalizado, pois a autora almeja confeccionar o volume 2 para falar sobre mulheres que conseguiram sair vivas das tentativas de feminicídio. Nathália é vencedora do prêmio Policiais Federais de Jornalismo de 2022 pelo livro-reportagem, acredita estar com o dever quase cumprido, com a realização do sonho e, assim, possui mais ânimo para continuar. 

As conquistas não param por aí. O aluno de Publicidade e Propaganda da FAESA Centro Universitário e estagiário de A Gazeta Luca Misse Moreno viu potencial no livro-reportagem de Nathalia. Para que as memórias das oito mulheres não fossem esquecidas e ganhasse mais visibilidade, decidiu transformá-lo no podcast “Para Sempre”, do programa “Todas elas”. A pretensão é sempre revelar os fatos para que a mensagem incomode ao ponto das pessoas, principalmente homens, terem atitudes de mudança e para deixar claro às mulheres que elas não estão só. 

O aluno de Publicidade e Propaganda da FAESA Luca Misse

Eu torço pra que quem ouça, entenda a mensagem e que lute conosco nessa luta tão complicada que é o feminicídio. As mulheres têm que parar de morrer

Luca Misse Moreno

O método de criação foi conduzido por mulheres em todas as partes do projeto. Com a supervisão das profissionais Joyce Meriguetti e Adriana Rios, pesquisa e texto pela Nathalia Ferreira e, também, Carolina Gomes que é ex-aluna da FAESA que cedeu a voz para os títulos dos capítulos. A escolha do modelo a ser seguido foi definido para mudar a rota do que já é produzido. Com o áudio, é possível instigar a sociedade a pensar e imaginar sobre o assunto, além de poder ser ouvido em qualquer lugar.

Capa do podcast Para sempre do projeto Todas Elas (Créditos: Geraldo Neto de A Gazeta)

O desafiador foi transformar o roteiro do livro-reportagem na linguagem audiovisual necessária para prender o ouvinte. Os episódios tem a média de duração de 15 minutos. Então, obteve bastante espaço para inserir elementos sonoros para despertar o interesse de quem ouvisse. A equipe já está pensando em expandir a iniciativa para outros projetos. 

O orientador do Livro-reportagem produzido por Nathália durante o período da faculdade, Valmir Matiazzi, explica como o processo pode ser um desafio para construir o produto final. São diversas etapas aplicadas em que é necessário se ambientar na temática, pesquisar e se aprofundar em conteúdos para embasamento teórico. Todas essas etapas geram uma troca de conhecimento entre o orientando e o orientado que serve para reconfigurar um novo conhecimento na construção do produto científico. O professor afirma que os frutos recolhidos pelo esforço da aluna deixaram todos os envolvidos muito satisfeitos com o fechamento de mais um ciclo acadêmico. 

O livro-reportagem “Para Sempre, elas” deu voz às mulheres que foram assassinadas, deu voz às famílias e aos amigos. O livro traz para a sociedade e para o jornalismo um olhar diferente. É preciso discutir essas informações e humanizar as vítimas do feminicídio para conseguir dar um ponto final nessa história repetida de violência

Valmir Matiazzi

Serviço dos produtos

Episódios produzidos pela A Gazeta:

Os outros 4 episódios serão atualizados assim que forem disponibilizados para o publico por A Gazeta

Edição: Loren Peterli

Imagem do Destaque: Loren Peterli