A tradição de manter a cultura do ‘Velho Bolachão’ em terras capixabas
Bruno Laurindo
Os discos de vinil marcaram época na história da música mundial, pois foram eles que introduziram, culturalmente, o conceito de “álbum” e que possibilitaram o consumo musical massivo. Os LP ‘s tiveram os dias contados com a chegada dos CDs e durante anos os dois formatos dividiram espaços nas lojas brasileiras, mas em 1997 a produção do disco de vinil parou em terras tupiniquins devido a uma pausa na Polysom, única fábrica existente naquela ocasião.
No Brasil, desde 2008, empresas nacionais e estrangeiras vêm estimulando um retorno nas fabricações dos discos de vinil com constantes matérias sobre o formato, a qualidade sonora, as artes das capas e seus adeptos. Na internet também é possível encontrar blogs e sites especializados na venda e na troca do “velho bolachão”.
De acordo com o capixaba Matosinho Braga, no Brasil há uma lógica com relação à suposta extinção do disco de vinil nos anos 90. “A chegada dos aparelhos de CDs traz a oportunidade de ouvir músicas com áudios mais limpos e a comodidade de ter em mãos um controle remoto que lhe permitia a troca de faixas com mais rapidez”, relata o comerciante que há dez anos possui uma loja de discos de vinil e CDs na Praia do Canto, em Vitória. Matosinho relata ainda que vende em média 70 discos de vinil por mês.
Apesar de não existirem ainda dados oficiais sobre o aumento na circulação do disco de vinil no País, a reabertura da Empresa Polysom, localizada em Belford Roxo, no Rio de Janeiro, e dá Vinil Brasil, instalada na Barra Funda, em São Paulo, trouxeram um fio de esperança para o futuro desse material que continua sendo sensação entre a velha e a nova geração.
Para Valter Vieira (Golias), dono do sebo “Golias Discos”, loja localizada no centro de Vitória, o disco de vinil não acabou e continua na ativa. “Eu falei há 15 anos que o vinil não iria morrer. Está todo mundo vendendo LPs. Todo mundo. Qualquer lugar que você vai, qualquer bairro, tem gente vendendo discos usados. É impressionante. O que eu mais queria era ver isso. É o que estou vendo”, afirma o comerciante.
“Eu falei há 15 anos que o vinil não iria morrer”
Valter Golias
Consumo
O Brasil chegou a ser o segundo maior consumidor mundial de LP ‘s, ficando atrás apenas da antiga União Soviética. Segundo dados da Associação Brasileira dos Produtores de Discos (ABPD), em 1989, 56,7 milhões LPs foram vendidos em terras brasileiras. Para profissionais e colecionadores, o “velho bolachão” nunca morreu e se tornou underground devido ao enfraquecimento natural da indústria fonográfica no Brasil.
O radialista e analista musical Marcus Alexandre, 55 anos, afirma que não houve retorno porque nunca houve partida. O que ocorreu foi o surgimento de mídias como o CD, MD e o streaming que atualizaram o ato de ouvir, conhecer, curtir e compartilhar música. “O registro musical do disco de vinil ficou para um público que tem saudades da “cerimônia” que começava na dificuldade de adquiri-lo até os cuidados para ouvi-lo. Do apreciar da capa, das contracapas, até os encontros para curtir um som”, destaca o apreciador.
História
O LP surgiu em 1948 quando Peter Goldmark, engenheiro da CBS, desenvolveu o microssulco reduzindo a velocidade dos discos de 78 para 33 rotações. A intenção era servir como suporte de armazenamento de música direcionada para o público adulto. O novo formato, mais resistente que os cilindros feitos de goma-laca, permitiu um armazenamento de 15 a 20 minutos em cada lado enquanto seu antecessor permitia apenas uma música por face. Já o disco de vinil em 45 rpm (rotações por minuto) foi importante para o desenvolvimento do rock’n’roll e para o consumo feito pela juventude.
Dados no site “Universo do Vinil” apontam que apenas 32 países no mundo fabricam discos de vinil em um total 115 fábricas ao todo. EUA e Reino Unido são líderes no ranking de produção do “velho bolachão”. O continente africano não tem nenhuma fábrica. No Brasil existem duas fábricas: a Vinil Brasil e a Polysom, que fabrica em média vinte mil discos de vinil por mês e, ainda, produz fitas cassetes.
Radialista há 30 anos e comunicador na rádio Tropical FM, Heckel Loureiro, 48, lembra com carinho dos discos de vinil. “Mais do que tudo é um saudosismo para as pessoas que trabalharam com isso e gostam do som e da magia do vinil. A qualidade é outra. É um som muito mais encorpado, mais audível. O vinil voltou à moda”.
Amigos do Vinil
Na Grande Vitória, até o primeiro semestre de 2018, acontecia o evento “Amigos do Vinil”. Cada edição era sediada em um local diferente. O evento tinha a intenção de manter viva a tradição do “velho bolachão” ao trazer adeptos de todos os cantos do Estado. O “Amigos do Vinil” era formado por colecionadores de discos que deram início trocando as raridades entre eles com encontros em lugares alternativos como bares e praças. Mas a ideia sempre foi reunir colecionadores com realizações das feiras de venda e troca.
O jornalista Eduardo Maia, 22, relata que os encontros eram bem legais e ajudavam a manter a história dos velhos bolachões. “Os ‘Amigos do Vinil’ era um evento aberto e qualquer um podia chegar e encontrar os discos para ouvir e comprar. Um momento de confraternização”.
Atualmente, o grupo “Amigos do Vinil” tem uma loja fixa localizada dentro do shopping Praia da Costa, em Vila Velha. Os encontros acontecem com frequência na própria loja e trazem, além de colecionadores e adeptos, jovens e curiosos. No estabelecimento são feitas compras, vendas e trocas dos LP ‘s em diversos estilos musicais que variam do rock’n’roll, jazz, música clássica, samba, entre outros.
Serviço
A loja “Amigos do Vinil” está localizada na avenida Dr. Olívio Lira, 353, segundo piso do shopping Praia da Costa, em Vila Velha. O horário de funcionamento é de segunda a sábado das 10 às 22 horas. Domingos e feriados das 14h às 20 horas.
Foto do Destaque: Bruno Laurindo