União da Comunidade Quilombola do Retiro preserva a memória dos ancestrais

Diogo Cavalcanti

A Comunidade Quilombola do Retiro, localizada no município capixaba de Santa Leopoldina, está a 47 quilômetros de distância da capital Vitória. A história dos quilombolas traz, diretamente, as marcas da escravidão. O local abriga cerca de 300 descendentes do ex-escravizado Benvindo Pereira dos Anjos. A propriedade comporta terrenos nos quais moram famílias que se valem do esforço diário para o sustento e superação de dificuldades. A principal substância para a conquista de direitos e manutenção da cultura é a história de luta e ensinamentos dos antepassados. A grande missão é transmiti-los às novas gerações.

Em um dos inúmeros terrenos do antigo quilombo mora Maria Barreto dos Anjos, 86 anos, aposentada. Dona Filhinha, como gosta de ser chamada, é tradicional moradora da região. Nascida e criada no mesmo local, tem 7 filhos, 14 netos e 16 bisnetos. Apesar de estar viúva há 14 anos, dificilmente fica sozinha. Ao redor da residência dela, moram três filhos e a casa sempre é repleta de visitantes e familiares. Ela conta que habita uma terra abençoada, em que tudo o que se planta dá.

A aposentada relata que a maioria dos moradores vive do que cultiva, mas muitos trabalham em outras cidades para complementarem a renda. Questionada a respeito da preservação cultural dos ensinamentos antepassados, Dona Filhinha assegura que os jovens continuarão com os valores transmitidos.

Por isso que estou aqui. Passo para os mais jovens os mesmos valores dados a mim desde a infância. Temos que nos virar sem depender dos outros e com as nossas próprias pernas

Dona Filhinha

Dagmar dos Anjos Pereira, 52 anos, diarista, é filha de Dona Filhinha e não compartilha a mesma certeza da mãe. Moradora de São Pedro, em Vitória, relata que, quando criança, as pessoas eram mais unidas e os familiares possuíam espírito de equipe. Segundo Dagmar, se chamassem todos para um mutirão de plantação ou construção de um terreno – na hora – estariam de prontidão. A tamanha perda de unidade por parte dos mais jovens a entristece.

Hoje, não há tanto amor em prol das boas causas. Não creio que os jovens continuarão com a cultura, principalmente em virtude das distrações da era digital

Dagmar, diarista

O Presidente da Associação de Moradores Quilombolas, Elimar Barreto dos Anjos, 43 anos, tem sido o canal de comunicação entre os moradores e o restante da sociedade na defesa das principais demandas. Vale ressaltar que lutar por direitos é, por certo, preservar a cultura e o que fora conquistado.

Embora possuam a propriedade definitiva das terras, com base no Art. 68 dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), há barreiras para conseguirem recursos junto ao poder público. Segundo Elimar que, além das ocupações junto à classe, é porteiro e proprietário de uma pequena padaria no quilombo, os moradores não conseguem gerar recursos relevantes que proporcionem contrapartida governamental.

Temos bastante incentivo municipal. Contudo não possuímos potencial financeiro para revertê-lo em vantagens para Santa Leopoldina

Elimar Barreto
Elimar afirma que a relação dos quilombolas com o restante de Santa Leopoldina é excelente (Foto: Matheus Rangel)

Elimar destaca que, a despeito das dificuldades, manter-se unido à família é a melhor forma de preservar a cultura quilombola. “Imagine se nós vendêssemos parte das nossas terras e um visitante chegasse: não nos encontraria. Permanecer unido a minha família é preservar a nossa identidade, nossa cultura, nossos direitos ”, exclama o morador.

Incursão a Santa Leopoldina

Um grupo de estudantes e professores de Jornalismo da FAESA Centro Universitário participou de incursão a Santa Leopoldina com o objetivo de imersão na cultura local. O enfoque da visita foi a Comunidade Quilombola do Retiro. Os participantes saíram de Vitoria às 7 horas e uma hora depois já estavam no Centro do município. Em seguida, em uma van, dirigiram-se para a Comunidade.

O objeto da pesquisa foi escolhido pelos próprios alunos, uma vez que, no mês de Outubro, o grupo realizara outra visita. Contudo, devido à grandiosidade cultural do ambiente, nem tudo pôde ser explorado. Os alunos foram recebidos com alegria e hospitalidade pelos moradores.

Edição: Diogo Cavalcanti

Foto de Destaque: Julia Moyses